Modelagem passará de concessão para autorização a fim de incentivar investimentos privados com base em interesses estratégicos de setores econômicos.
Um projeto de lei que tramita no Senado Federal, prevendo a mudança no sistema de construção de ferrovias no País, poderá facilitar a criação da Estrada de Ferro Minas-Espírito Santo, projetada pelo grupo Petrocity para ligar a cidade de Sete Lagoas (MG), ao Norte de Belo Horizonte, ao complexo portuário de São Mateus, cujas obras poderão ser iniciadas até julho deste ano.
De acordo com a especialista em ferrovias Ana Flávia Azeredo, que desenvolve uma linha de pesquisa de mestrado e doutorado chamada “Project Finance”, o projeto facilita construção de ferrovias por mudar o regime de concessão para simples autorização do Governo Federal para a implantação da via. “Assim, o investidor particular poderá construir sua própria ferrovia, investindo onde achar mais oportuno e conveniente, esta é a proposta do projeto”, disse Ana Flávia.
O projeto de lei que trata do assunto leva o número PLS 261/2018 e tramita na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal. O texto, do senador José Serra (PSDB-SP), garante a exploração indireta, pela União, do transporte ferroviário em infraestruturas de propriedade privada entre portos e fronteiras nacional; que transponham os limites de estado; ou que se conectem às ferrovias federais.
MELHORES PRÁTICAS
A ideia é incorporar as melhores práticas disponíveis no cenário internacional e introduzi-las, com as adaptações necessárias, na legislação brasileira. “Não estamos reinventando a roda, apenas aproveitamos o que há de mais bem-sucedido, seja na legislação nacional em outras áreas de infraestrutura, seja na experiência ferroviária de outros países que conseguem atrair investimentos privados para o setor”, afirma Serra.
Segundo o senador, no âmbito dos trens de passageiros, por exemplo, existe mito de que eles são sempre antieconômicos, precisando ser subsidiados por pesadas contribuições estatais. No entanto, diz ele, a realidade pode ser diferente: a experiência japonesa e a norte-americana mostram que a exploração imobiliária do entorno das estações permite serviços de transporte de passageiros integralmente privados.
De acordo com Ana Flávia, o “Project Finance” é uma alternativa à PPP (Parceria Público Privado, que tem dinheiro público. A engenheira desenvolveu uma dissertação de mestrado nesse área para a construção de um metrô no Brasil. Outro especialista, Ricardo Trevisan, escreveu um artigo em setembro de 2016 onde defende a mesma linha de raciocínio.
“Este tipo de financiamento é muito utilizado em todo o mundo há décadas, e tem financiado projetos ligados a petróleo, gás, energia elétrica, infraestrutura de transportes, mobilidade, saneamento básico, entre outros. Em países desenvolvidos, o Project Finance é muito utilizado desde os anos 1980, mas já era utilizado no financiamento comercial europeu do século VII. Grandes navegações ibéricas, as Cruzadas, expedições Holandesa e Inglesa das Companhias das Índias tinham como retorno e garantia o fluxo de recursos obtidos pelo próprio projeto. Projetos ferroviários, estradas e pontes da Europa já eram financiadas desta forma antes da Primeira Guerra Mundial”, diz Trevisan.
FERROVIA DO NOROESTE
No caso da Estrada de Ferro Minas-Espírito Santo, Ana Flávia Azeredo defende que basta “fazer a modelagem do projeto”. A EFMES atravessará a região Noroeste, entrando no Estado vizinho pelo município de Mantena e passando pela região de mineração de ferro, até alcançar Sete Lagoas.
O CEO da Petrocity, José Roberto Barbosa da Silva, disse que “o projeto é flexível, com possibilidade de trens de carga e também de passageiros, pois a ferrovia terá bitola larga de 1,60 metro, permitindo maior velocidade”. A ideia ganhou muita força nas últimas semanas, com a adesão de políticos das bancadas estadual e federal de Minas Gerais.
De acordo com a ideia que vem sendo discutida pelo líder do projeto da Petrocity, paralelamente ao Centro Portuário de São Mateus, a ferrovia terá UTACs (Unidades de Transbordo e Armazenagem de Carga) em Barra de São Francisco (ES), Governador Valadares, Santa Maria do Itabira, Confins (para cargas de alto valor agregado) e Sete Lagoas, onde poderá integrar-se a outros modais para transportar grãos do Centro-Oeste para exportação.
O deputado Enivaldo dos Anjos (PSD), que representa o Norte e o Noroeste na Assembleia Legislativa, acompanha todos os debates sobre o assunto. “Isso está gerando uma grande expectativa não apenas na nossa região, mas no Estado inteiro e, agora, mais ainda em Minas Gerais, por causa da possibilidade de construção da ferrovia”, disse o parlamentar.
A matéria, que trata do mudança do regime de concessão para autorização, aguarda relatório da senadora Lúcia Vânia (PSB-GO). Após análise da CAE será encaminhada para Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI) e Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde será votada em decisão terminativa.